21 setembro 2011

Tropeçando no meu pé

Certa vez, após o culto de domingo, eu aguardava para atravessar a rua diante da igreja quando um dos jovens me perguntou se eu havia feito minha tatuagem antes ou depois de minha conversão. Surpreso com minha resposta, conversamos um pouquinho sobre o assunto.  Quanto a isto, sem dúvida alguma, existe muita polêmica entre os cristãos.

A tatuagem se encaixa na categoria de “assuntos discutíveis”, onde a Bíblia não é clara. “Mas, espera aí,” alguém diria, “a Bíblia diz em Levítico 19:28: 'Pelos mortos não ferireis a vossa carne; nem fareis marca nenhuma sobre vós: Eu sou o Senhor.'  Está bem claro, não?”
Como sempre, é importante olharmos para o contexto.

Esta passagem em Levítico, incluindo o texto onde está inserida, trata especificamente de rituais religiosos pagãos dos povos que viviam ao redor dos israelitas. O desejo de Deus é não deixar o seu povo misturar-se com as outras culturas. O foco aqui é proibir a feitiçaria e a adoração pagã e mundana. Deus proíbe que seu povo santo (separado) se envolva na feitiçaria e na adoração pagã e idólatra, imitando os pagãos. Ele assim o faz para proteção, porque ele sabe que isto os levará para longe do Deus verdadeiro e único. (Nesta passagem, tais práticas proibidas incluem: comer carne com sangue, prever ou adivinhar o futuro, certos cortes de cabelo relacionados aos sacerdotes pagãos, cortar ou fazer marcas no corpo por causa de parentes mortos, consultar videntes e a prostituição cultual)

No vers. 28 encontramos a palavra em hebraico “qa aqa”, traduzida como “marca” em português (no inglês “tattoo marks”). É importante notarmos que o contexto desta passagem bíblica não é sobre decoração corporal artística mas sobre fazer marcas corporais ligadas a um culto religioso pagão.

É interessante observarmos o vers. 26: Não comereis coisa alguma com sangue; não agourareis nem adivinhareis e o vers. 27: Não cortareis o cabelo em redondo, nem danificareis as extremidades da barba. Bom, certamente muitos cristãos hoje em dia comem carne mal passada (“pingando sangue”, como se diz), usam certos cortes de cabelo (e fazem a barba!) sem que participem da adoração proibida dos pagãos. Naquele tempo esses costumes eram associados aos ritos e rituais pagãos. Hoje não são.

Vamos um pouco mais a fundo.

Os comentários bíblicos nos falam sobre essas práticas religiosas contra as quais  Deus advertia seu povo.

“A prática de fazer cortes profundos no rosto, braços e pernas, em tempo de luto, era universal entre os pagãos e era considerada uma marca de respeito pelos mortos, assim como um tipo de oferta propiciatória às divindades que presidiam a morte e a sepultura. Os judeus aprenderam este costume no Egito e, embora o tivessem deixado, voltaram a esta velha superstição em uma época posterior de degeneração (Is 15:2; Je 16:06; 41:5). nem fareis marca nenhuma sobre vós" (v: 28) – através de tatuagem, imprimindo figuras de flores, folhas, estrelas e outros dispositivos fantasiosos em várias partes de seus corpos. A impressão era feita às vezes por meio de um ferro quente, às vezes por tinta ou pintura, como é feito pelas mulheres árabes dos dias atuais e as diferentes castas dos hindus. É provável que uma forte propensão a adotar tais marcas em honra de algum ídolo tenha ocasionado a proibição neste versículo e foram sabiamente proibidos.” 
Jamieson, R., Fausset, A. R., Fausset, A. R., Brown, D., & Brown, D. (1997). A commentary, critical and explanatory, on the Old and New Testaments

Pelos mortos não ferireis a vossa carne;” (v. 28) – aqui se refere à prática de se fazer cortes profundos na pele durante o luto pela morte de um parente. Isto era feito para fornecer o sangue da vida ao espírito da pessoa morta, em vez de expressar tristeza. (Péter-Contesse, R., & Ellington. (1992). A handbook on Leviticus)

As "marcas" descritas em Levítico 19:28 eram claramente relacionadas às práticas das falsas religiões. A palavra qa aqaaparece apenas uma vêz na Bíblia, nessa passagem em Levítico. Esta palavra literalmente significa “cortar”, porém, considerando-se as palavras vizinhas, indica um corte que deixava uma marca impressa na pele. Isto poderia ser alguma forma de marca, cicatriz, corte, ou um processo onde tinta era introduzida dentro da pele. Não há dados suficientes para uma definição exata e completa daquilo que a palavra significava. Entretanto, a palavra “qa aqa” está, nesta passagem, sem dúvida, sendo usada no contexto de adoração religiosa de culto pagão. A proibição contra “qa aqa” (traduzida como tatuagem em inglês), era para evitar que os israelitas se envolvessem ou se afiliassem com práticas de culto pagão.

A tatuagem dos dias de hoje é muito diferente daquilo que foi para aqueles que originalmente receberam o Pentateuco. Atualmente é uma forma artística de expressar-se e uma decoração corporal pessoal. Em nossa presente cultura as pessoas modificam sua aparência em prol da beleza de várias maneiras: escolha do vestuário, maquiagem (definitiva ou não), cirurgia plástica, estilo de corte e coloração do cabelo, perda de peso, musculação, brincos nas orelhas, unhas esmaltadas, etc. Algumas dessas práticas possuem uma história em ritual antigo e falsas religiões, mas em nosso contexto cultural não denotam uma conexão com o maligno ou falsa fé. Da mesma maneira as tatuagens hoje não vinculam o usuário a práticas de culto pagão e geralmente não são feitas com propósitos religiosos antigos. Tatuagens hoje são para ornamentação.

Uma outra razão para se acreditar que cristãos são livres para tatuarem o corpo é que os crentes do Novo Testamento não estão vinculados às leis do Antigo Testamento para conquistar ou reconquistar um relacionamento correto com Deus. Se fôssemos obedecer às leis do Antigo Testamento também deveríamos nos submeter a regras que restringem mariscos e comer carne de porco, estilos de cabelo, uso de roupas feitas de dois tecidos diferentes e até mesmo comer queijo no hambúrguer (sim, é verdade).

Alguns também acreditam que modificar o corpo de alguma forma contamina a criação de Deus, mas se isso fosse verdade seria certo furar as orelhas, corrigir um pé torto, cortar o cabelo, aparar as unhas, pegar um bronzeado ou fazer tratamento ortodôntico? Cada uma das práticas mencionadas anteriormente modifica a forma como fomos originalmente criados, alguns permanentemente.  

Fazer uma tatuagem é uma escolha muito pessoal que cai na categoria de aparência pessoal e está vitalmente ligada à liberdade do crente. O apóstolo Paulo nos lembra que a Lei do Antigo Testamento foi projetada por Deus para conduzir as pessoas na direção de Jesus. Agora que Jesus veio e nos libertou, não estamos debaixo da lei para termos um bom relacionamento com Deus. Nossa posição correta diante de Deus vem de colocarmos a nossa confiança na morte de Jesus na cruz para pagar as nossas dívidas e não em seguir as normas do Antigo Testamento.

De maneira que a lei nos serviu de aio (tutor) para nos conduzir a Cristo, a fim de que fôssemos justificados por fé. Mas, tendo vindo a fé, já não permanecemos subordinados ao aio.”(Gálatas 3:25 e 26)

Tatuagens hoje podem ser imagens que simplesmente agradem ao portador ou podem ter um significado mais profundo. Muitos cristãos exibem uma tatuagem não como tributo a um falso deus ou deidade anti-cristã, mas em amor pelo único e verdadeiro Deus e Criador. Muitos utilizam essa marca como uma forma de glorificá-Lo. Outros descobrem que a tatuagem atrai perguntas sobre a sua fé e oferece oportunidade para contar a estória do amor de Deus para os que ainda não creem.

Portanto, ainda existe a importante pergunta: ter uma tatuagem seria uma forma de adoração pagã e mundana, ainda proibida por Deus nos dias de hoje?  A resposta é que este assunto é discutível e deve ser tratado de acordo com Romanos capítulo 14. É também importante examinarmos nosso coração e nossos motivos antes de tomarmos qualquer decisão. 

Para mim, essa "marca" que considero bonita e de bom gosto me faz lembrar que não sou perfeita. Sou uma pecadora perdoada por Deus e não tenho mais de que me envergonhar. Essa "marca" também me diz que, assim como outras pessoas podem fazer algum julgamento sobre mim, eu preciso tomar cuidado para não julgar erroneamente o meu próximo.

Interessante como ninguém menciona os tres furos em minhas orelhas... mas a tatuagem chama a atenção.  Sendo assim, fica aqui um pedido: 


Por favor, não tropece no meu pé! 





Material para esta postagem encontrado nos sites:
http://www.sacredink.net


2 comentários:

Lucas Lima disse...

Rejane, que o Senhor te abençoe e guarde, continuamente!

Fabiane Gesteira disse...

Muitíssimo interessante o seu artigo!A tatuagem no meio cristão é tratada como um pecado, ou algo que faz parte da vida de alguém antes da sua conversão.Infelizmente nos esbarramos nestas pessoas, que com certeza até se mudássemos a cor do cabelo ou colocássemos uma bijuteria diferente, seria um motivo mais que suficiente para falar.

Que Deus abençoe sua vida....mulher mais que especial,

BjOo ... vc é demais!!